Após Campinas atingir 100% de lotação nos leitos públicos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) para covid-19 no primeiro dia da fase emergencial do Plano São Paulo, a Prefeitura anunciou ontem (15) que estuda adotar o lockdown na cidade. A medida mais severa - que pode impedir circulação de pessoas durante certo período - é defendida por especialistas da área da saúde e também jurídica.
Em Campinas, o lockdown pode ser adotado devido ao colapso da rede pública e pressão também na rede privada. Ontem, apenas 19 leitos de UTI-Covid estavam disponíveis em hospitais privados do município.
Hoje, o prefeito de Campinas, Dário Saadi (Republicanos), se reúne com prefeitos da RMC (Região Metropolitana de Campinas) para debater o lockdown, também pedido pela Abresc (Associação de Bares, Restaurantes e Similares de Campinas). A reunião com as cidades da região deve ocorrer pela manhã e os detalhes de como seria o lockdown na cidade ainda não foram divulgados.
Ainda por conta da situação considerada grave, a Administração suspendeu as cirurgias eletivas na rede privada
ontem. Em São Paulo, o governador João Doria (PSDB) também disse que que não descarta endurecer ainda mais as restrições no Estado para conter o avanço da covid-19 caso a atual fase emergencial não dê resultados (leia aqui).
Ontem também Campinas registrou um marco negativo nessa pandemia. A cidade ultrapassou 2 mil mortos pela doença (veja aqui).
MEDIDA NECESSÁRIA
Para o médico epidemiologista da Faculdade São Leopoldo Mandic, André Ribas, a adoção do lockdown é importante em Campinas para diminuir, de forma drástica, a transmissão de covid-19. "É uma medida que, do ponto de vista social é altamente custosa, no sentido das pessoas de se privarem de liberdades, mas tem que ser adotada em algumas situações. Em Campinas é necessário", disse ele.
Ribas, no entanto, afirma que a medida não deveria partir somente do governo municipal, mas sim do estado. "Campinas não deveria ser uma coisa isolada. Isso fragiliza um pouco o resultado. As medidas de controle devem ser tomada de forma organizada. No estado de São Paulo, já está claro que a situação é bastante complicada. E as medidas tomadas agora, com um pouco mais de rigor, não são muito diferentes das anteriores", analisou.
Ele afirmou que os efeitos de um lockdown serão sentidos em no mínimo 14 dias, que é o período da incubação da doença. "O resultado pleno das medidas demora até um pouco mais para surtir efeito. Começa a partir de sete dias, que é a média de incubação. Mas, quanto maior foi o tempo de quarentena, melhor serão os efeitos", disse. O médico também defendeu a adoção de uma política pública de rastreio dos contactantes, como forma de controlar ainda mais o avanço do coronavírus.
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Já o infectologista da PUC-Campinas, André Bueno, afirmou que qualquer medida que promova uma restrição de circulação, diminuindo a probabilidade da ocorrência de aglomeração, terá efeito para frear as transmissões.
"Isso vai depender de quão ampla será essa medida, no caso o lockdown. Com as pessoas saindo o mínimo de casa é possível que a gente consiga reduzir as transmissões", disse.
Ele ressaltou que uma medida como essa traz um custo político e econômico que são relevantes, mas o lockdown é o que funciona por conta da doença ser transmissível no contato entre pessoas. "Como a gente já está com 100% de ocupação na maioria dos dias, já perdemos o momento adequado de adotar essas medidas mais drásticas", avaliou.
JURIDICAMENTE RESPALDADO
Sobre a situação legal da medida mais restritiva, o advogado especialista em direito público Paulo Braga afirmou que ela estará respaldada juridicamente caso esteja apoiada em critérios técnicos, que provem de fato que o lockdown é necessário para conter o avanço da covid-19.
"Embora seja uma medida extrema, drástica, se o prefeito adotar essa medida de lockdown apoiado em critérios técnicos, que indiquem que esta é a medida mais necessária, e mais eficiente, ele estará resguardado da Constituição Federal", disse. Ele afirmou ainda que não vê possibilidade de processos contra a Administração caso ela decida adotar o lockdown.
"Se o governo do Estado ou o prefeito municipal tiverem critérios técnicos que indicam que este é o melhor caminho, o poder judiciário, em hipótese alguma, poderia atender pedidos de empresas e comércios", disse. O advogado reiterou, no entanto, que o Executivo deverá provar que tem em mãos estudos que indiquem a necessidade.