A pandemia de Covid-19 tirou a Parada do Orgulho LGBT de Campinas das ruas, justamente no ano da 20ª edição, mas não vai impedir a realização do evento. No próximo domingo, dia 28 de junho, as pessoas que estariam ocupando o espaço público para dar visibilidade à luta da comunidade LGBT terão que ficar em casa, em frente ao computador ou ao celular. Isso porque a Parada será virtual, o que não significa que a essência do movimento será perdida, conforme explica Douglas Holanda , presidente da Associação da Parada e Apoio LGBT de Campinas.
“A gente sabe que na internet as pessoas têm devorado as redes sociais. A única maneira de não perder tanto a finalidade do movimento é não deixando passar em branco um dia tão importante como é o dia 28 de junho. É o dia do nosso orgulho, dia que tem uma importância imensa no nosso movimento. Não podemos deixar de ocupar espaços. Se a gente não pode estar na rua, a gente vai continuar levando conhecimento, entretenimento e militância para essas pessoas pela internet”, disse Holanda em entrevista ao iG.
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O dia 28 de junho ficou marcado na história porque foi nessa data, em 1969, que uma série de manifestações tomou as ruas de Nova York em protesto contra uma violenta invasão policial no Stonewall Inn , bar bastante frequentado por gays e drag queens. O episódio, conhecido como Rebelião de Stonewall , durou cinco dias, e hoje é tratado como um marco.
Esse histórico de lutas, somado à necessidade de dar visibilidade à causa, torna muito importante a ocupação das ruas, por isso a impossibilidade de organizar o evento da maneira tradicional causou certa frustração. Ainda assim, a organização preferiu não assumir o risco de gerar um foco de coronavírus durante a realização da Parada.
“Até que saia uma vacina, um remédio, eu acho muito difícil que eventos de grande porte como o nosso, que ano passado recebeu entre 100 e 110 mil pessoas, possa acontecer com segurança. Eu não consigo controlar, que seja mil pessoas ,vamos pensar assim. É muita gente aglomerada, gente que vai usar máscara, gente que não vai usar, e a responsabilidade da Associação é muito grande em relação a isso”, avalia Douglas Holanda
“Sem dúvida, a gente perde muita visibilidade, em um momento em que o fascismo está tomando conta do país e do mundo, em um momento onde a gente tinha que estar nas ruas gritando e lutando pelos nossos direitos, a gente vai fazer de uma forma diferente. Geralmente, as pessoas vão até nós, mas em 2020 nós vamos até as pessoas”, completa.
Representatividade
O evento contará com atrações como Alexandrite Moonsun e Grupo Choque Triplo, além de conversas com especialistas e militantes. Boa parte das apresentações foi gravada previamente, mas a celebração será comandada ao vivo pela veterana Helloa Meirelles , drag queen com 31 anos de carreira que terá a missão de fazer com que as pessoas se sintam representadas.
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“A gente tem que encarar isso como mais uma luta entre tantas outras que a gente trava desde 1969, porque tudo começou no dia 28 de junho de 69, em Stonewall. De lá par cá, a nossa vida é de luta, e esse ano não vai ser diferente. De uma maneira diferente, estaremos presentes pra que todos nos vejam. Nosso número vai estar lá, desta vez pela internet, mas vamos levar essa mensagem de que estamos aqui, queremos ser vistos, queremos ser respeitados. A mensagem que a gente quer passar é que vivemos mais um ano de luta”, diz Helloa.
Presente na primeira Parada do Orgulho LGBT de Campinas , em 2001, a drag também lamenta a impossibilidade de ir às ruas, mas entende que o momento não é adequado para isso.
“A gente perde muito essa presença, esse calor humano, essa quantidade que costuma impressionar bastante. Isso é bom para gente, principalmente para os políticos entenderem a nossa força, a nossa união e o nosso mundo. Perde? Perde sim, mas não é uma opção, é uma responsabilidade de tentar proteger os nossos e não fazer na rua”, comenta.
Valorização regional
Com a realização do evento pela internet, surgiu a possibilidade de buscar um alcance além de Campinas e das cidades próximas, já que não é preciso se preocupar com o deslocamento das atrações, mas a Associação da Parada preferiu manter a linha de valorizar artistas da região .
“A gente sempre deu espaço para artistas da região, da cidade, nossa prioridade é trazer representatividade com os artistas que estão com a gente durante todo o tempo, todo o ano. Já fui cobrado várias vezes do por que uma parada tão grande como a de Campinas, a segunda maior do estado, maior do interior de São Paulo, não tem artistas de nome, a nível nacional ou internacional. Eu sempre respondo que minha prioridade são artistas da região”, afirma Douglas Holanda.
“Eu acho injusto que pessoas que lutam todos os dias para fazer a cena mudar, para lutar por direitos, não tenham nenhuma representatividade em um momento como a parada, um momento de mais visibilidade, quando possíveis contratantes estão vendo esses artistas. Faz parte das obrigações da associação promover a cultura LGBT, e é isso que a gente tem feito”, completa.
Além das atrações regionais, a Parada deve fazer uma homenagem para Miss Biá, drag queen pioneira no Brasil, que morreu de Covid-19 no início de junho, aos 80 anos. Ela tinha 60 anos de carreira e ainda estava na ativa, se apresentando todos os sábados na casa de shows Danger, em São Paulo.
Domingo
A Parada LGBT de Campinas está marcada para as 16 horas deste domingo, dia 28. A live será transmitidas nos canais oficiais da organização ( Facebook , Instagram e Youtube ).
“O orgulho deve existir todos os dias a partir da hora que a gente acorda. Nunca foi tão difícil fazer militância em um momento como esse que a gente está vivendo, mas não é para ninguém desistir, é para continuar todo mundo lutando e, detalhe, se cuidando. Cuide-se por você, cuide-se pelos que você ama, e cuide-se até por quem você não conhece ou não tem nenhum apreço, porque cuidando dessas pessoas automaticamente você está cuidando de você”, finaliza Douglas Holanda.