Após mais de 15 dias na fase emergencial da quarentena decretada pelo Estado, Campinas ainda vive uma situação crítica da pandemia , apesar de os indicadores de Covid-19 indicarem uma leve melhora.
Nesta semana, a cidade chegou a bater recorde de mortes pela doença nos últimos dias - chegando a ter 60 óbitos registrados em um boletim epidemiológico da Prefeitura no dia 29 de março e 45 ontem (30). Os hospitais também continuam lotados (leia mais abaixo).
No entanto, a Prefeitura informou ontem que há uma redução nos casos de pacientes com síndromes gripais que chegam às unidades básicas de saúde e também há uma estabilização, nos últimos cinco dias, no número de pacientes na fila de espera por internação em UTI (Unidade de Terapia Intensiva) e enfermarias.
Além disso, a taxa de reprodução do vírus, que estava acima de 1, agora está em 0,98, ou seja, cada 100 infectados transmitem o vírus para 98 pessoas. Essa taxa já chegou a 1,2 em Campinas (em meados de fevereiro). Esses números indicariam uma leve melhora na situação epidemiológica da cidade, mas ainda é preciso ter atenção.
"São menos casos novos chegando. Mas ainda temos muitas mortes, porque são pessoas que se infectaram lá atrás. O importante é não ter infecção, porque não teremos internados em UTI e nem em enfermaria", afirmou a diretora do Devisa (Departamento de Vigilância Epidemiológica), Andrea von Zuben.
RESTRIÇÕES
Além da fase emergencial, a cidade está quase completando um mês de medidas restritivas aplicadas pelo município - incluindo a fase vermelha, que começou no dia 3 de março em Campinas. Até então, ela era a mais restritiva do Plano São Paulo e incluiu a suspensão de atendimentos presenciais em comércios e restaurantes, suspensão de aulas e até mesmo toque de recolher.
Nesse período, de acordo com a Prefeitura, entre os dias 28 de fevereiro a 6 de março, foram atendidas nas unidades básicas de saúde 11.706 pessoas com síndromes gripais. Como indicação do resultado das medidas, na atual semana, a 13ª, que ainda não se completou, foram atendidas 2.504 e projeções indicam que chegarão a 6.260 até 3 de abril.
"Isso mostra que o isolamento e uso de máscara surtem efeito", disse Andrea. Apesar disso, a ocupação dos hospitais públicos e privados ontem era de 96,81% e havia uma fila de espera de 181 pacientes que aguardavam leitos em enfermarias e UTIs (Unidades de Terapia Intensiva).
FASE EMERGENCIAL
A medida inédita e a mais restritiva do Plano São Paulo começou a valer em todo o estado no dia 15 de março. A tentativa é a de conter o avanço da covid-19, que tem feito a rede de saúde de várias cidades paulistas colapsar.
A princípio, a fase emergencial tinha previsão de acabar nesta quarta-feira (30), mas com a manutenção da pressão no sistema público de saúde, e aumento nos casos da doença, a medida foi prorrogada até o dia 11 de abril. Ontem, a Prefeitura também suspendeu o retorno das aulas presenciais também até o dia 11.
CENÁRIO
No dia 15 de março, quando a fase emergencial começou a valer, Campinas tinha 366 pacientes ocupando leitos na cidade, o que até então correspondia a ocupação geral de 95,06%. Nos leitos municipais e estaduais, já não havia vagas e a fila de espera era de 100 pacientes aguardando por leito.
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Ontem (30), no último boletim divulgado pela Saúde, havia 59 pessoas a mais internadas na cidade, também com mais leitos sendo disponibilizados (439). A ocupação total, incluindo hospitais públicos e privados, era de 96,81%.
Com 100% de ocupação em leitos municipais e estaduais, a lotação agora é vista também na rede particular, sendo que hoje há apenas 14 leitos disponíveis. No total, 181 pacientes estão à espera de leitos de enfermaria e de UTI hoje no SUS municipal.
BALANÇO
Dia 15/03
- 366 leitos ocupados
Dia 16/03
- 371 leitos ocupados
Dia 17/03
- 390 leitos ocupados
Dia 18/03
- 385 leitos ocupados
Dia 19/03
- 400 leitos ocupados
Dia 22/03
- 402 leitos ocupados
Dia 23/03
- 397 leitos ocupados
Dia 24/03
- 399 leitos ocupados
Dia 25/03
- 412 leitos ocupados
Dia 26/03
- 434 leitos ocupados
Dia 29/03
- 426 leitos ocupados
Dia 30/03
- 425 leitos ocupados
NO LIMITE
Em entrevista no último sábado (27), o presidente da Rede Mario Gatti, Sérgio Bisogni, disse que a última semana foi intensa e de "guerra". Segundo ele, mesmo com as aberturas de leitos e restrições em vigor, a cidade está no limite do número de novos leitos possíveis de abrir.
"A pressão essa semana (semana passada) foi muito complicada, foi uma pressão terrível. O mais preocupante é que estamos chegando no limite de abertura de leitos, razão pela qual houve endurecimentos. As restrições aumentaram nessa semana na tentativa de diminuir a expansão de infecções por covid. Nós estamos chegando no limite. Esse é o aviso que temos que dar", disse.
A mesma percepção é vista pelo infectologista Rogerio de Jesus Pedro. "A gente que está no serviço vê muitos casos e um impacto verdadeiro na evolução. Todos os serviços estão lotados, simplesmente. Só não temos pânico por ser algo bem organizado. Mas estamos no limite do limite", afirmou.
Para Rogério, a adesão às medidas mais duras ainda não foi vista inteiramente pelos moradores da cidade. "A população não está seguindo e não está entendendo a extensão das restrições. O impacto a gente sente na cidade, com ruas mais vazias, mas não foi um impacto grande como deveria ser. As restrições não foram atendidas, ainda estão tímidas, em banho-maria".
QUANDO OS RESULTADOS SERÃO VISTOS?
Para a infectologista Noelle Mioto, o período para os efeitos começarem a ser vistos ainda não começou.
"Os efeitos ainda não tiveram tempo suficiente para serem vistos, até porque normalmente é justamente o prazo de 15 dias para ter algum reflexo", disse ela. Miotto no entanto afirma que a sensação é que ainda falta adesão da população e medidas mais intensas por parte do poder público.
"Os efeitos são muito mais expressivos quando se adota um lockdown, como vimos em Araraquara, que os efeitos ainda vieram 1 mês depois, ou em cidades da Europa, com restrições ainda maiores do que vimos aqui. É preciso que as pessoas fiquem ainda mais em casa, temos índices de isolamento ainda não satisfatórios" disse.
Rogério também defende que ainda é cedo para resultados, mas afirma que a partir de agora, análises terão que ser feitas para estudar o impacto e a adesão das restrições
"O tempo ainda está curto, mas a partir de agora já temos o tempo de observação. O impacto sobre novos casos demora 15 dias ou mais, então podem começar a ser vistos agora", disse.
"Caso não haja o impacto evidente, deveríamos entrar em restrição mais forte e que faz mais sentido. As medidas têm que ser avaliadas para ver se são suficientes, e caso confirmem que não são, seria necessário radicalizar ainda mais, mesmo sendo uma questão difícil", finalizou.